Ontem a noite tive a oportunidade de participar de uma degustação bem bacana com vinhos africanos preparada pela Vinhos de Bicicleta, em São José dos Campos. A idéia principal da degustação era difundir um pouco mais os vinhos sul africanos, não tão bem conhecidos por aqui, e mostrar que existem diferenças de terroirs por lá também o que gera vinhos diferentes mesmo utilizando-se a mesma casta. E olha que a história vitivinícola africana é muito antiga, remetendo às tradições do Velho Mundo mas com a cara bastante influenciada pelos estilos do Novo Mundo.
A
Vinhos de Bicicleta nasceu primeiramente como um clube de vinhos, depois de uma viagem de seu fundador,
Rodrigo Ferraz, a Mendoza na Argentina. Esta viagem tinha como foco bodegas de pequeno porte, as chamadas bodegas boutique ou familiares (já falei sobre isso
aqui) e a atmosfera intimista com os vinhos artesanais de cada lugar. Rodeado de história, aromas e sabores, inebriado pela paisagem percorrida, Rodrigo veio com a idéia de fundar um clube de vinhos com foco neste estilo de vinho, e começou a garimpar exemplares ao redor do mundo. Algum tempo depois conseguiu ainda abrir uma loja física com espaço para eventos/degustações e voilá, lá estávamos na sede da
Vinhos de Bicicleta. E devo dizer que a loja física deles é muito bacana, uma boa seleção de rótulos, espaço aconchegante e muito bem localizada em São José dos Campos, no interior de São Paulo.
Todos os vinhos da noite seriam oriundos de uma região africana conhecida como "Western Cape", área esta litorânea mais ao sul do país que inclui a famosa Cidade do Cabo (sua capital) e que dentre outras características, é bastante influenciada pelas correntes marítimas vindas principalmente do Atlântico. Possui ainda solos graníticos na proximidade com o litoral o que acaba por transmitir ao vinho certa mineralidade. Passando aos vinhos degustados, postarei a seguir minha impressão sobre cada um deles. Vamos lá?
O primeiro vinho da noite foi o
Out of Africa Pinotage 2012. Este vinho é da vinícola
African Terroir, que possui diversas linhas de vinhos, mas talvez a mais conhecida no Brasil seja sua linha de entrada, a
Tribal. O vinho em questão é um exemplar feito 100% com uvas
Pinotage (cuja origem já foi discutida
aqui) colhidas no período noturno(o clima notoriamente mais frio evita que a fermentação das uvas comece antes da entrada na adega). Ao que tudo indica não passa por madeira. De coloração violácea bem intensa, o vinho não apresentava qualquer halo de evoluação e denunciava sua jovialidade, contando ainda com lágrimas finas, rápidas, coloridas e abundantes. Aromas de frutos vermelhos silvestres e toques florais. Com algum tempo em taça evolui para compota de frutos vermelhos e algo de chocolate. Na boca o vinho tinha corpo leve para médio, acidez bastante pronunciada e taninos bem fininhos. Final de média duração com um leve toque mineral perceptível. Me pareceu um vinho bem gastronômico, apesar de estar um pouco desequilibrado, mas com tendência a evolução.
O segundo vinho provado foi o Quantum Pinotage 2011, vinho este que também é feito com uvas Pinotage só que desta vez nas mãos da cooperativa Du Toitskloof Winery. A cooperativa se estabeleceu em meados dos anos 60 com cerca de 6 produtores mas atualmente este número já supera os 20 cujos vinhedos estão todos dentro de um raio 10 quilômetros da adega. Está localizado perto da cidade de Rawsonville no vale do Rio Breede. Este já passa por 8 meses de barricas. A coloração não muda muito do primeiro vinho. Nos aromas a diferença é mais pronunciada, com aromas de frutas em compota, chocolate, baunilha e toques terrosos. Apresenta mais corpo, acidez mais regulada e taninos macios. Mais equilibrado que o anterior. O final decepciona, passa rápido pela boca. Não evolui muito com o tempo em taça. Declínio é rápido.
O terceiro vinho da noite foi o BlouVlei Red Blend 2008, quando a coisa começou a se tornar mais séria e deveras interessante. Este vinho é um corte das uvas internacionais Cabernet Sauvignon, Merlot, Shiraz e Cabernet Franc produzido pela Mont du Toit Kelder. Seus vinhedos estão aos pés do monte Hawequa. Este vinho já passa por 18 meses em barricas de carvalho francês. A coloração já acusa um pouco da idade, sendo que o vinho mostrou cor rubi sem brilho e com certo halo tendendo ao granada. Lágrimas já quase incolores. Aromas de frutos negros e vermelhos em compota, chocolate, baunilha, pimenta e toques animais (couro). Na boca uma surpresa, encorpado, taninos mais presentes e acidez na medida. Retrogosto com algo vegetal, distanciando o paladar do olfato. Vinho interessante e saboroso. O preferido da noite, sem dúvida.
E chegamos ao último vinho da noite, o Roodeberg Red Blend 2010, vinho este produzido pela KWV que também é uma cooperativa de produtores da África do Sul. No entanto, a própria KWV incentiva e permite que cada produtor mantenha as características dos seus vinhos, criando a possibilidade de se mostrar as características de cada pedacinho de terra da região. Este vinho nasce assim, um corte de Cabernet Sauvignon, Merlot, Syrah e Petit Verdot. Passa por 10 meses em barricas. Apresentou coloração violácea de boa intensidade, brilho e lágrimas finas e ligeiramente coloridas. Aromas de compota de frutas vermelhas e escuras, pimenta, chocolate e algum tostato. Vinho encorpado, taninos marcados e com boa acidez. Retrogosto confirmando o olfato. Final de longa duração. Grande vinho sem dúvidas.
Ao final a noite, depois também de aproveitarmos uma mesa com azeites, queijos e antepastos especialmente preparados para o evento, com o intuito de harmonizarmos com os vinhos, era hora de nos despedirmos de mais um evento sensacional. Além dos bons vinhos, pude conhecer pessoas interessantes como o próprio Rodrigo, proprietário da loja, ou Raul, português que trabalha trazendo vinhos lá da terrinha e desaguando por aqui. Ainda quero ter a oportunidade de provar seus vinhos. E espero também ter a oportunidade de visitar a Vinhos de Bicicleta novamente em breve. Eu mais do que recomendo!
Até o próximo!